06/08/2008

O meu novo cérebro.

O que acham que acontece ao cérebro de alguém que passa horas por dia a navegar na Internet, a enviar e receber ‘e-mails’, a comentar em blogues?
Estamos a ficar menos inteligentes todos os dias. Primeiro pensei que o facto pudesse ser explicado com a idade, porque afinal há muitas operações mentais que deixam de ser possíveis aos trinta anos, ou mesmo antes. Qualquer matemático ou compositor musical sabe muito bem ao que me refiro.
Talvez o leitor esteja a experimentar um processo semelhante. Vou falar apenas do que me parece mais evidente: uma enorme incapacidade de concentração. Primeiro tentei o velho truque de ler ou pensar no lugar mais barulhento da cidade. O barulho obriga a concentrar. Depois, como a estratégia deixou subitamente de resultar, comecei a apreciar as viagens de avião, uma espécie de convento moderno, o martírio do corpo ao serviço da alma. Um avião é o único sítio onde ainda é possível ler um livro do princípio ao fim.
Ultimamente o problema atingiu proporções tão sérias que resolvi encontrar um culpado. O escritor Nicholas Carr sugeriu recentemente que a Internet pode estar a modificar radicalmente o modo como pensamos. Cada vez mais os nossos cérebros processam informação do mesmo modo que a internet a distribui: em pequenos pedaços descontínuos, relacionados de um modo inteiramente pessoal ou mesmo aleatório, sempre em movimento. Pensem no que isto significa. A neurociência tem mostrado conclusivamente que o cérebro é fisicamente modificado pelas actividades que exerce. O cérebro de um compositor ou de um carpinteiro são fisicamente diferentes. O que acham que acontece ao cérebro de alguém que passa várias horas por dia a navegar na internet, a enviar e receber ‘e-mails’, a comentar em blogues?
Ao longo de séculos ou milénios o cérebro humano foi moldado pelo acto de ler um livro ou ouvir uma palestra. Agora as influências são outras. E se o nosso modo de pensar é diferente, se o nosso cérebro deixou de funcionar da mesma maneira, então o culpado pode muito bem ser a tecnologia da informação. Se uma ideia não consegue prender a nossa atenção em cinco segundos, passamos a outra ideia. Se alguém se atreve a expor um argumento sem ajudas visuais, olhamos para ele como para um louco incoerente.
Sempre pensei que o cérebro humano seria eventualmente modificado por meio de novas e poderosas tecnologias genéticas. Afinal o processo pode estar a acontecer muito mais naturalmente. A nossa memória, a nossa atenção e a nossa inteligência são já em larga medida imitações da tecnologia que usamos. Quando compramos a nova versão de um programa informático, é uma nova versão do nosso cérebro que levamos para casa.

Por: Bruno Maçães - b.macaes@ecla.de

 

 

 

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