30/11/2004

Dia de Merda

Quem já teve uma dor de barriga, sabe como é....
Aeroporto de Buenos Aires, 15:30 hs.
Tenho um pequeno mal-estar causado por uma cólica intestinal, mas nada que uma urinada e uma cagada não aliviasse. Mas, atrasado para pegar o autocarro que me levaria para o aeroporto, do outro lado da cidade, de onde partiria o vôo para Córdoba, resolvi segurar as pontas, "afinal de contas, são só uns 15 minutos de viagem."
Chegando lá, tenho tempo de sobra para dar uma mija tranquilo. O avião só sairia as 16:30. Entrando no autocarro, sem sanitários, senti a primeira contração e tomei consciência de que minha gravidez fecal chegara ao nono mês e que faria um parto de cócoras assim que entrasse no wc do aeroporto.
Virei-me para o meu amigo que me acompanhava e subtilmente, falei: "Fogo, mal posso esperar para chegar na merda do aeroporto porque preciso largar um barro."
Nesse momento, senti um urubu beliscando minha cueca, mas pus a força de vontade a trabalhar e segurei a onda. O autocarro nem tinha começado a andar quando para meu desespero, uma voz em castelhano disse pelo alti-falante:
"senhoras e senhores, nossa viagem até o aeroporto levará em torno de 1 hora".
Aí o urubu ficou maluco querendo sair a qualquer custo! Fiz um esforço hercúleo para segurar o comboio de merda que estava para chegar na estação ânus a qualquer momento. Suava em bicas. Meu amigo percebeu e, como bom amigo que era, aproveitou para gozar comigo.
O alívio provisório veio em forma de bolhas estomacais indicando que pelo menos por enquanto as coisas tinham se acomodado alí.
Tentava me distrair vendo a paisagem mas só conseguia pensar numa casa de banho, não com uma privada, mas com uma sanita, tão branca e tão limpa que alguém poderia pôr o seu almoço nela.
E o papel higiênico então: era branco e macio e com textura e perfume e oops! Senti um volume almofadado entre meu traseiro e o assento do autocarro e percebi consternado que havia cagado. Um cocó sólido e comprido daqueles que dão orgulho de pai ao seu autor.
Daqueles que dá vontade de ligar pros amigos e parentes e convida-los a apreciar, na privada, tão perfeita obra:
daria para expor no CCB!
Mas sem duvida, não nesse caso. Olhei para meu amigo, procurando um pouco de solidariedade, e confessei sério: "Olha, caguei-me."
Quando meu amigo parou de rir, uns cinco minutos depois, aconselhou-me a ficar no centro da cidade, escala que o autocarro faria no meio da viagem, e que me limpasse em algum lugar. Mas resolvi que ia seguir viagem, pois agora estava tudo sob controlo. "Que se lixe, limpo-me no aeroporto," - pensei - " pior que isso não fico."
Mal o autocarro entrou em movimento, a cólica recomeçou forte.
Arregalei os olhos, segurei-me na cadeira mas não pude evitar, e sem muita cerimónia ou anunciação, veio a segunda leva de merda.
Desta vez como uma pasta morna.
Foi merda para tudo que é lado, borrando, esquentando e lambuzando o cu, cuecas, barra da camisa, pernas, calças, meias e pés.
E mais uma cólica anunciando mais merda, agora ilquida, das que queimam o fofo do freguês ao sair rumo a liberdade. E depois um peido tipo bufa, que eu nem tentei segurar, afinal de contas o que era um peidinho para quem já estava todo cagado.
Já o peido seguinte foi do tipo que pesa e eu caguei-me pela quarta vez.
Lembrei-me de um amigo que, certa vez, estava com tanta caganeira que resolveu pôr Carefree na cueca, mas colocou com as linhas adesivas viradas para cima e quando foi tira-lo, levou metade dos pelos do rabo junto.
Mas era tarde demais para tal artifício absorvente.
Tinha menstruado tanta merda que nem uma bomba de cisterna poderia me ajudar a limpar a sujeirada.
Finalmente cheguei ao aeroporto e saindo apressado com passos curtinhos, supliquei ao meu amigo que apanhasse minha mala no bagageiro do autocarro e a levasse aos sanitários do aeroporto para que eu pudesse trocar de roupas.
Corri ao banheiro e entrando de boxe em boxe, constatei a falta de papel higiênico em todos os cinco. Olhei para cima e blasfemei:
"Agora chega, né ?! " Entrei no último, sem papel mesmo, e tirei a roupa toda para analisar minha situação (que conclui como sendo o fundo do poço) e esperar pela mala da salvação, com roupas limpinhas e cheirosinhas e com ela uma lufada de dignidade no meu dia.
O meu amigo entrou no banheiro com pressa, tinha feito o "check-in" e ia correndo tentar segurar o vôo. Jogou por cima do boxe o cartão de embarque e uma maleta de mão e saiu antes de qualquer protesto da minha parte. Ele tinha despachado a mala com roupas. Na mala de mão só tinha um pulôver de lã com gola em "V". A temperatura em Buenos Aires era de aproximadamente 35 graus. Desesperado, comecei a analisar quais de minhas roupas seriam, de algum modo, aproveitáveis. Minhas cuecas, joguei no lixo.
A camisa era história. As calças estavam deploráveis e assim como minhas meias, mudaram de cor tingidas pela merda.
Os meus sapatos estavam nota 3, numa escala de 1 a 10.
Teria que improvisar.
A invenção é filha da necessidade, então transformei uma simples privada numa magnífica máquina de lavar. Virei as calças do lado avesso, segurei-a pela barra, e mergulhei a parte atingida na água.
Comecei a dar descarga até que o grosso da merda se desprendeu.
Estava pronto para embarcar. Saí do banheiro e atravessei o aeroporto em direção ao portão de embarque trajando sapatos sem meia, as calças do lado avesso e molhadas da cintura ao joelho (não exatamente limpas) e o pulôver gola em "V" sem camisa.
Mas caminhava com a dignidade de um lorde.
Embarquei no avião, onde todos os passageiros estavam esperando o "RAPAZ QUE ESTAVA NA CASA DE BANHO" e atravessei todo o corredor até o meu assento ao lado do meu amigo que sorria.
A hospedeira aproximou-se e perguntou se precisava de algo.
Eu cheguei a pensar em pedir uma gilete para cortar os pulsos ou 130 toalhinhas perfumadas para disfarçar o cheiro de fossa transbordante, mas decidi não pedir e respondi:

" NADA, OBRIGADO, EU SÓ QUERIA ESQUECER ESTE DIA DE MERDA!"
rui xisto

Sem comentários: