01/06/2006

Quando Nietzsche Chorou… - Irvin Yalom

Dois homens juntos pelo destino unem-se para combater um inimigo comum. Esta premissa é provavelmente das mais usadas em inúmeras obras, mas neste caso o inimigo é bem diferente do comum. Em vez de um senhor do mal, um arqui-vilão criminoso ou um político corrupto encontramos um conjunto de inimigos que nos dizem muito mais. Estes são o desespero, a solidão interior, a obsessão amorosa e sexual, a morte e o sentido da vida. No fundo, inimigos que cada um de nós conhece bem melhor do que os vilões mais habituais dos livros e do cinema.

Josef Breuer é um médico Vienense bem sucedido. Apesar de ser de ascendência judaica, e de praticar alguns preceitos religiosos de forma mecânica, é um ateu convicto que se sente preso a uma vida que sente não ter escolhido. Está casado com uma mulher bonita, e têm filhos, mas sente-se só e numa vida sem sentido. Uma paixão com uma doente sua, Berth, que sofria de problemas mentais graves, levou a sua mulher a exigir-lhe que a enviasse para outro médico. No entanto, Breuer nunca conseguiu afastar da sua mente Bertha, passando os dias a pensar nela. Até que em Veneza lhe aparece Lou Salomé, uma mulher Russa, que lhe pede para tratar de um problema de enxaquecas constantes que um amigo seu sofre, e que está no limiar do suicídio.

Esse amigo de Lou Salomé é um filósofo alemão praticamente desconhecido das pessoas da época, Friedrich Nietzsche. Mais do que ateu, Nietzsche é um dos pais do Nihilismo, defendo que Deus foi algo criado pelo homem, e entretanto morto pelo mesmo homem. Apesar de já ter várias obras publicadas, estas são conhecidas apenas por um punhado de pessoas. Ele mesmo afirma que o seu primeiro discípulo está ainda por nascer, acreditando que um dia os seus pensamentos serão lidos, conhecidos e respeitados, mas que não estará já vivo para assistir. Sentindo-se traído pelo seu corpo que não lhe dá descanso, pelos amigos que não acredita ter e pela mulher que não o ama, vive como um saltimbanco solitário. O seu orgulho é a única coisa que o motiva ainda a viver, tentando passar para o papel todos os seus pensamentos para futuras gerações.

Ao longo de todo o livro, o leitor é levado a tentar perceber a maneira de pensar destas grandes mentes enquanto também eles o fazem entre si. Ao longo das séries de conversas, somos convidados a fazer as perguntas que Breuer e Nietzsche colocam um ao outro, a nós mesmos. Estas conversas podem ser encaradas quase como percursoras da Psicologia e Psicanálise, juntando a tudo isto um personagem que aconselha Breuer, o seu discípulo Sigmund Freud.

Um romance que consegue fazer pensar, sem se tornar enfadonho e mantendo uma estória coesa, interessante e surpreendente, enquanto assistimos a uma batalha épica contra alguns dos mais fortes medos humanos.

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