03/12/2008

Quatro anos de governo de Sócrates na economia

por Eugénio Rosa [*]
RESUMO DESTE ESTUDO
Uma das mensagens que Sócrates e todo o governo têm procurado fazer passar, é que o País estava a recuperar, mas que a crise financeira internacional, de que ele não tem culpa, veio estragar tudo. Isso não é verdade pois o agravamento da situação é também anterior à crise.
No período de 2005-2008 com Sócrates, o crescimento económico em Portugal foi, em média, igual a menos de metade da média da União Europeia, pois em quatro anos Portugal cresceu apenas 4,8% enquanto a UE27 aumentou 9,8%. Como consequência o PIB por habitante SPA, ou seja, anulado da diferença de preços, cresceu em Portugal apenas 2.500 euros, enquanto subiu em média na UE27 mais de 3.300 euros. Portugal durante este período afastou-se em todos os anos, em termos económicos, ainda mais da União Europeia.
Mas mesmo crescendo pouco, uma parcela cada vez maior da riqueza criada foi transferida para o estrangeiro, ficando no País para investimento e para melhorar as condições de vida dos portugueses cada vez menos. Em 2004, foram transferidos para o estrangeiro, sob a forma fundamentalmente de juros e de dividendos, 25.943 milhões de euros, ou seja, 18% da riqueza criada nesse ano em Portugal (PIB). Depois de três anos de governo de Sócrates, ou seja, em 2007, e antes da crise se declarar com força, foram já transferidos 33.398 milhões de euros, isto é, 20,5% do PIB. Dividindo este último valor pela população empregada nesse ano obtém-se 6.460 euros por empregado, o que representa mais 27,5% do que em 2004.
Entre 2005 e 2008, o saldo negativo da Balança Corrente, ou seja, das nossas contas com o exterior, aumentou 33%. No conjunto dos quatro anos, o saldo negativo acumulado atingiu 64.081 milhões de euros. Em 2008, ele corresponderá a 11% do PIB, quando em 2005 era 9,5% do PIB. Esta variação negativa do saldo da Balança Corrente é também um indicador importante da crescente falta de competitividade da economia portuguesa. E apesar do défice das contas externas do País ser superior em cerca de 5 vezes ao défice orçamental, este governo apenas se preocupa e fala do défice orçamental ignorando o défice das contas externas do País cujas consequências no desenvolvimento futuro do País serão certamente muito graves.
Em 2005 a divida líquida do País ao estrangeiro atingia 93.510 milhões de euros e, em 2007, já era de 146.592 milhões de euros, ou seja, mais 56,8%. No mesmo período, o PIB cresceu apenas 12,9%. Como consequência a divida externa aumentou, entre 2004 e 2007, de 64,8% do PIB para 90% do PIB. Em todos os anos de governo de Sócrates a divida externa cresceu de uma forma rápida, e não apenas depois de se ter declarado a crise financeira internacional.
Entre 2004 e 2007, a divida das famílias aumentou 30,5%, pois passou de 112.198 milhões de euros para 146.393 milhões de euros, enquanto as remunerações dos trabalhadores, sem incluir contribuições para a Segurança Social, subiram apenas 10,9%, ou seja, praticamente um terço da subida verificada no endividamento das famílias. Em 2007, a divida média por família era já de 40.665 euros quando em 2004 era de 31.100 euros por família.
Em relação às empresas o endividamento foi também rápido e crescente nos anos de governo de Sócrates. Entre 2004 e 2007, passou de 139.804 milhões de euros para 185.728 milhões de euros, ou seja, aumentou 32,8%, com o consequente disparar dos encargos financeiros.
É evidente que Portugal se encontra, como consequência também da politica que tem sido seguida, numa situação extremamente fragilizada para enfrentar a grave crise actual. A politica errada seguida por este governo que definiu como objectivo central da sua politica a redução do défice orçamental subordinando a isso tudo, está-se a revelar um erro estratégico que o País e os portugueses têm pago e vão continuar a pagar caro. Qualquer economista sabe que a chamada "consolidação orçamental" nunca deverá ser feita em período de crise. Em período de crise, como aquele que Portugal vive há mais de quatro anos, era fundamental uma forte intervenção do Estado para dinamizar a economia e defender o tecido social. Recentemente, o premio Nobel da Economia e o novo presidente dos Estados Unidos vieram afirmar que mais importante que a redução do défice é dinamizar a economia. O governo de Sócrates nunca compreendeu isso, tendo sempre seguido o caminho contrário. Mesmo o OE2009 é dominado pela obsessão do défice, já que fixa um défice de 2,2%. O próprio ministro das Finanças, em declarações feitas na Assembleia da República, pôs em causa a possibilidade disso ser cumprido, mas Sócrates, desdizendo-o, veio logo afirmar que não via nada para aquele valor de défice não ser cumprido. Sócrates, com a ignorância e insensibilidade como trata os problemas económicos e sociais também, perante os dados do INE que revelavam um aumento do desemprego, declarou aos órgão de informação que era uma "Boa Noticia". Será que o 1º ministro pensa o mesmo em relação aos dados sobre a economia?
Uma das mensagens que o governo tem procurado fazer passar, e que certamente se vai acentuar com o agravamento da crise e a proximidade de eleições, é que o País estava a recuperar mas que a crise externa, que ninguém esperava e de que o governo não tem culpa, veio estragar tudo. Ora isso não corresponde à verdade pois mesmo antes da crise se ter declarado de forma mais visível o agravamento dos problemas no campo da economia era já evidente, como mostraremos utilizando para isso apenas dados oficiais. Para além disso, o governo manteve-se sempre cego e surdo perante os sinais claros da crise e face a advertências que muitos economistas faziam, incluindo nós próprios, ouvindo apenas os neoliberais defensores da consolidação orçamental a todo o custo
UMA PARTE CRESCENTE DA RIQUEZA CRIADA NO PAÍS É TRANSFERIDA PARA O EXTERIOR
Mas mesmo a riqueza criada resultante daquele reduzido crescimento não fica, na sua totalidade, no País. Como o quadro seguinte, construído com dados do Eurostat e do Banco de Portugal, revela uma parcela crescente dessa riqueza está a ser transferida para o estrangeiro.
Em 2004, foram transferidos para o estrangeiro, sob a forma fundamentalmente de juros e de dividendos, 25.943 milhões de euros, ou seja, 18% da riqueza criada nesse ano em Portugal (PIB). Depois de três anos de governo de Sócrates, ou seja, em 2007, foram transferidos 33.398 milhões de euros, isto é, 20,5% do PIB. Dividindo este último valor pela população empregada nesse ano – 5.169.700 – obtém-se 6.460 euros mais 27,6% do que em 2004. É este o valor médio da riqueza anual criada por empregado em Portugal que é transferido para o estrangeiro.
É evidente, que transferindo-se cada vez mais riqueza para o estrangeiro, menos fica no País para melhorar as condições de vida dos portugueses e para investir. É esta também uma das consequências da politica que tem sido seguida, que não se verificou apenas em 2008, mas em todos os anos de governo de Sócrates.
DÉFICE EXTERNO CINCO VEZES SUPERIOR AO DÉFICE ORÇAMENTAL
Uma das razões desta transferência crescente de riqueza para o exterior, resulta do elevado saldo negativo das contas externas portuguesas que é revelado pela Balança Corrente. O quadro seguinte, construído com dados do Banco de Portugal, mostra a crescente degradação das nossas contas externas.
Entre 2005 e 2008, o saldo negativo da Balança Corrente, que engloba a quase totalidade das relações comerciais e outras com o exterior, aumentou 33%, somando, para os 3 anos um saldo negativo de 64.081 milhões de euros. Em percentagem do PIB, este saldo negativo atingirá, em 2008, cerca de 11%, portanto mais 15,% do que em 2005, que foi de 9,5%. Esta variação negativa do saldo da Balança Corrente é também um indicador importante da crescente falta de competitividade da economia portuguesa.
É revelador da incapacidade deste governo para compreender e resolver os problemas do País, a forma pouca responsável como trata esta questão, pois apesar deste défice ser quase cinco vezes superior ao défice orçamental e de maior gravidade, ele não tem merecido atenção e referência por parte do governo. E como se mostrou este défice não se limitou ao ano de 2008, período em que a crise se acentuou.
O ENDIVIDAMENTO EXTERNO CRESCEU EM TODOS OS ANOS DO GOVERNO DE SÓCRATES
O saldo negativo crescente das nossas contas externas tem determinado o aumento rápido do endividamento do País. É o que revela o quadro seguinte construído com dados do Banco de Portugal.
Em 2005 a divida externa líquida do País atingia 93.510 milhões de euros e, em 2007, já era de 146.592 milhões de euros, ou seja, mais 56,8%. No mesmo período, o PIB cresceu apenas 12,9%. Como consequência, entre 2004 e 2007 a divida externa líquida aumentou de 64,8% para 90% do PIB. Portanto, em todos os anos de governo de Sócrates a divida externa cresceu de uma forma rápida, e não apenas depois de se ter declarado a crise financeira internacional.
AUMENTO RÁPIDO DA DÍVIDA DAS EMPRESAS E DAS FAMÍLIAS
Durante os quatro anos de governo de Sócrates registou-se também um rápido endividamento das empresas e das famílias portuguesas como revela o quadro seguinte construído com dados do Banco de Portugal
Entre 2004 e 2007, as dividas das famílias aumentaram 30,5%, pois passou de 112.198 milhões de euros 146.393 milhões de euros, enquanto as remunerações dos trabalhadores, sem incluir as contribuições para a Segurança Social, subiram apenas 10,9%, ou seja, praticamente um terço da subida verificada na divida das familias .
Em relação às empresas o endividamento foi também rápido e crescente nos anos de governo de Sócrates. Entre 2004 e 2007, passou de 139.804 milhões de euros para 185.728 milhões de euros, ou seja, aumentou 32,8%, com o consequente disparo dos encargos com a divida.
POLÍTICA SEGUIDA FRAGILIZOU MAIS O PAÍS NÃO O PREPARANDO PARA A CRISE ACTUAL
É evidente que Portugal encontra-se, como consequência também da politica seguida por este governo, numa situação extremamente fragilizada para enfrentar a grave crise actual. A análise anterior feita com base em dados oficiais mostrou que a politica seguida, em que a obsessão de reduzir o défice foi o principal, para não dizer mesmo, o único objectivo, subordinando a essa obsessão tudo o resto e, de uma forma particular, a politica económica, agravou a situação económica herdada, fragilizando ainda mais a economia portuguesa, as empresas e as famílias, e não as preparando para enfrentar uma crise como a actual.
A redução continuada do investimento público (entre 2005 e 2009, o investimento previsto no PIDDAC diminuiu, mesmo em valores nominais, em 31%); nos anos 2007 e 2008 apenas foram utilizadas (despesa validada) cerca de 5% das verbas do QREN disponibilizadas pela União Europeia para estes dois anos, associada à contracção imposta nas restantes despesas públicas e a outras medidas, como a chamada "reforma da Administração Pública" etc., bem como à total passividade face a problemas graves, de que é exemplo o crescente défice das nossas contas externas; tudo isto, reduziu o investimento necessário para modernizar o País tendo desorganizado e fragilizado o Estado, e contribuiu para aumentar o endividamento do País, das famílias e das empresas, debilitando-as e tornando a estas mais difícil a tarefa de enfrentar uma crise como a actual.
A redução do défice orçamental feita erradamente em pró-ciclo (numa altura em que o País precisava mais da intervenção do Estado para dinamizar a economia, ela foi reduzida para assim se reduzir o défice) e numa altura em que Portugal procurava sair de uma grave crise, está a custar e vai continuar a custar caro ao País e aos portugueses. Ela poderá pôr em causa mesmo os resultados obtidos no campo orçamental, pois a crise e a situação do País, das famílias e das empresas vai exigir ao Estado uma forte intervenção, naturalmente com custos muito mais elevados (recorde-se os 24.000 milhões de euros para a banca, os mais 1.000 milhões de euros que vão custar a nacionalização de um banco, o BPN) se a politica seguida nestes últimos anos tivesse sido outra, e tivesse contribuído para robustecer o tecido económico e social do País.
Infelizmente Sócrates recusa-se a reconhecer o erro estratégico que cometeu, subestimando a economia, e não consegue ainda perceber essa verdade que a evolução da realidade torna cada vez mais evidente. O próprio ministro das Finanças, na reunião realizada na Assembleia da República em 20/11/2008, para debater o OE2009 afirmou textualmente que as "colunas em que assentava o cenário macroeconómico utilizado na construção do OE2009 estavam a abanar" e, consequentemente (acrescentamos nós), está a abanar todo o OE2009. Só Sócrates, com a ignorância com que fala de problemas económicos, é que parece que ainda não compreendeu isso, continuando a afirmar que o défice de 2,2% é para cumprir.
Economista, edr@mail.telepac.pt

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